- Vê que horas são? Tenho que ir embora.
Ele, mesmo ainda habitando o universo da preguiça, me puxa pra perto, envolve seus braços grandes em torno de mim, enquanto encaixo minha cabeça no espaço certinho criado pelo vão da sua clavícula direita.
- Deixa eu colocar um travesseiro aqui, pra você não se machucar.
Ele, meio sonolento, puxa a pontinha do travesseiro para deixar o encosto mais confortável para mim. Mal ele sabe que, no mundo, não há lugar que me traga mais aconchego do que deitar naquele corpo – com ou sem osso.
E ele lembra do horário.
- Mas já se passaram quarenta minutos? Para mim não pareceram nem cinco, eu digo, pensando que o relógio não seria tão cruel se soubesse a sensação que eu estava vivendo naquela hora. – Só mais cinco minutos, se não vai ficar tarde.
Sei disso. E sei que, milhares de vezes, dormi muito pouco por causa dos minutinhos a mais, cada um deles vale a pena.
- Não quero que você vá embora. Só mais um pouquinho, tá?
Ele finge que acredita e, como numa sintonia, viramos. Acho engraçado como não nos importamos em nos virar quantas vezes forem necessárias durante a madrugada. Nosso barato mesmo é deitar colados, juntos, conectados. Se um quer virar pra direita, o outro vira também. Ninguém se importa. O importante é não perder o laço.
Ele puxa meu corpo de encontro ao seu, passa seu braço por debaixo do meu pescoço, ao mesmo tempo em que tiro os cabelos da nuca, para que ele possa encaixar seu rosto nela sem pinicar. A respiração dele na minha nuca sempre foi pra mim uma forma de carinho. O ar quente me esquenta e aumenta aquela preguicinha gostosa. Mas hoje é terça-feira. Terça com cara de sexta, porque amanhã é praticamente um feriado. Tem espaço para preguicinhas gostosas. Fiquei me lembrando como as noites com ele são boas, ficar colado sem fazer absolutamente nada por horas a fio, ouvindo música boa, ganhando e fornecendo carinhos.
- Preciso ir, daqui a pouco vai amanhecer.
É uma pena. É uma pena que tenha passado rápido. É uma pena você não poder dormir até tarde aqui comigo. É uma pena eu não ter sua presença sempre que dá vontade. As poucas horas de sono que eu teria ganham importância pequena, diante daquelas horas de paz e de aconchego. Encaixo meu rosto no pescoço dele, respiro fundo, como que pra guardar o cheiro dele dentro de mim. E fico pensando, ainda sem coragem de deixá-lo ir, que todo mundo precisa de um aconchego desses. O aconchego deixa a vida mais quentinha.
Ele se despede com um beijinho depois daqueles beijos que transbordavam vontade. As vezes completo com um comentário falando que adorei a companhia, mesmo se eu não falar, ele sabe.
E eu fico ali, com a energia recarregada e cheia de coragem de enfrentar a manhã seguinte, pensando que a coisa que a gente mais precisa na vida é aconchegar, e se deixar aconchegar.